Os empresários portugueses gerem as empresas com o coração
16-05-2019
O laboratório de colaboração Link Lab Coimbra do projeto AEP Link, organizado pela Associação Empresarial de Portugal, que decorreu esta manhã no Instituto Pedro Nunes (IPN) e juntou a 16 de maio meia centena de empresários para promover a competitividade do tecido empresarial, prosseguiu a com discussão de boas práticas no investimento, num painel promovido pela Iberinform, e na cooperação, numa conversa dinamizada pelo IPN. Durante a conversa, os empresários consideraram que as empresas portuguesas são geridas com o coração, o que pode apresentar diversos constrangimentos ao seu crescimento.
Dinamizado pela Iberinform e moderado por João Luís Campos, diretor adjunto do Diário de Coimbra, o painel de investimento contou com José Pissarra, coordenador nacional de vendas e gestão de clientes da Iberinform, António Henriques, diretor executivo do Grupo CH Consulting, Manuel Felix, managing director da Euro Tyre, e Jorge Martins, diretor executivo da Euromadeira. João Luís Campos lançou o tema questionando as razões que explicam a reduzida expressão do investimento no país, e Jorge Martins considerou que residem essencialmente na falta de confiança. Constatou que não é fácil trabalhar numa empresa familiar e que tem de se arriscar, não se pode ficar preso à falta de incentivos. E esta tem de ser, acima de tudo, uma opção do empresário. Tem de haver confiança nos fornecedores, nos clientes, no equipamento, e tem de se "agarrar” nos aprendizados que já se tem e na experiencia da sua equipa, e integrar tudo isto com as novas tecnologias.

José Pissarra, António Henriques, Manuel Félix, Jorge Martins e João Luís Campos
Para Manuel Felix há uma série de componentes que limitam o investimento, essencialmente a não existência de empresas com gestão profissionalizada, o que leva ao investimento com pouca estratégia e com planeamento ineficaz. O nosso tecido empresarial permite-nos ser flexíveis, considerou, mas para o investimento, que exige programação e organização, está num estádio muito embrionário. Por outro lado, o sistema financeiro hoje não financia, logo isso é uma limitação, além das más opções que muitas empresas fizeram no passado e que as deixaram descapitalizadas.
António Henriques defendeu que é errado pensar que não há investimento: reduziu de facto, mas os apoios estão disponíveis e há bons exemplos. Porém, os investimentos hoje são diferentes dos do passado, hoje uma boa parte do investimento e intangível. A isto junta-se a "irracionalidade” da banca e a necessidade de garantir profissionalismo nos projetos que são submetidos, que não podem ter fragilidades. Concomitantemente, as margens são cada vez mais esmagadas, logo os investimentos têm de ser mais contidos. E depois há a questão da confiança e da instabilidade a nível mundial: nada é garantido.
José Pissarra concordou: os níveis de investimento não são baixos. É preciso ter em conta a realidade do tecido empresarial português, já que 60% do tecido empresarial do distrito de Coimbra são microempresas, ou seja, falamos de 1% de grandes empresas neste distrito. Isto explica as preocupações relacionadas com o investimento que as empresas têm para fazer no desenvolvimento de negócios, na diferenciação. Outros fatores são a falta de liquidez, de rentabilidade e a segurança e confiança, que são fundamentais. A segurança traduz-se na capacidade de desenvolver modelos de gestão de risco que permita avaliar e mitigar o risco. A gestão tem de ter em linha de conta o que acontece no tecido como um todo, porque pode criar constrangimentos na atividade da empresa; por outro lado, os bancos exigem cada vez mais garantias.
Jorge Martins considera que a inovação por vezes é restringida com imponderáveis, que põem em xeque a sobrevivência das empresas. Neste contexto, considera que é preciso cultivar as relações, por exemplo com os bancos que hoje olham o empresário como mais um número: há que fomentar relações, as relações não podem ser descoradas nos negócios, não podem ser substituídas pelo digital nem pelo papel.
Manuel Felix conta que a experiência lhe ensinou que cumprir aquilo a que nos propomos com parceiros, sejam deadlines, pagamentos dentro do prazo, controlar os processos, é essencial porque cria confiança e segurança. "A mudança faz-se dentro da empresa”, e só assim se consegue pagar a horas e ter bons balanços, que mais facilmente conseguem ser aceites na banca. O empresário português acostuma-se a "culpar” o cliente que não paga a horas, gere a empresa com o coração e as margens vão descendo, e é uma bola de neve. Há que começar dentro de casa, controlar as contas, e assim é mais fácil ter margem para investir, para crescer sustentadamente.
Um dos outros obstáculos ao investimento tem a ver com pessoas, considerou António Henriques. Muitas vezes há investimento aprovado, mas as empresas não conseguem colocar pessoas qualificadas para dar andamento ao projeto. A gestão de pessoas é essencial e deve ser prioridade neste campo.
O último painel do dia, dedicado à cooperação e dinamizado Jorge Pimenta, gestor de projetos do IPN, contou com as intervenções de Alcides Marques, gestor de projetos do LIS – Laboratório de Informática e Sistemas, Miguel Monteiro, diretor executivo da Mythical Technologies, e Paulo Caridade, diretor executivo da Spacelayer Technologies.

Miguel Monteiro, Paulo Caridade, Alcides Marques e Jorge Pimenta
Jorge Pimenta fez uma breve apresentação do INP, criado para fomentar a cooperação entre a universidade e os centros tecnológicos através da investigação aplicada, incubação e aceleração de empresas, e formação. Os laboratórios do IPN trabalham em áreas diversas e a incubadora recebe essencialmente spin-offs das escolas, tendo já apoiado a criação de mais de 300 empresas.
Miguel Monteiro explicou o negócio da Mythical, que opera na bolsa de apostas com o software Traderline, o MetodoDinheiro e a Betfair. A empresa tenta neste momento diversificar, criando novos produtos para poder escalar o lucro da empresa, e tem contado com o apoio e cooperação essenciais do IPN. A Spacelayer Technologies faz consultoria em geotecnologia à administração pública, e o responsável, Paulo Caridade, conta que tiveram de se reinventar depois de um colapso por altura da crise económica. O IPN passou a ser um paceiro fundamental do projeto, que hoje atua além-fronteiras. A empresa mantem estreitas relações com outras das empresas incubadas no IPN.
Sobre as dificuldades das start-ups e a viagem de uma ideia até se converter num produto, Alcides Marques considera que o principal desafio é a gestão de expectativas. Não basta ter ideias, há que ser empresário além de empreendedor, para ter acesso a financiamento.
Um outro desafio destas empresas é posicionarem-se de modo a construir pontes para cooperar com grandes empresas. Paulo Caridade considera que a paixão pelo projeto é um dos fatores diferenciadores essencial, assim como a garra e a união da equipa, que permitem rapidamente desenvolver novos projetos. «É esta motivação, foco e implementação rápida que podemos oferecer a grandes empresas. Podemos pegar em ideias e reconvertê-las de forma muito eficaz, e isso traz confiança aos parceiros. As start-ups podem dar esse apoio disruptivo».
Sobre a dificuldade em captar recursos humanos qualificados, Alcides Marques considera que na área tecnológica há muita pressão para que os bons quadros saiam do país, porque têm melhores condições, logo a oferta não satisfaz a procura. E, por isso, o recrutamento começa muito cedo, abordando os estudantes logo na escola, prática seguida por todos os oradores. Miguel Monteiro considera que a forma de conseguir competir com as grandes empresas é tentando dar outras mais-valias para manter as pessoas, a começar no espírito familiar de uma pequena empresa.
O Link Lab Coimbra é promovido pela AEP – Associação Empresarial de Portugal, Câmara de Comércio e Indústria, que conta com o envolvimento da Deloitte, com o apoio da Konica Minolta, Crédito y Caución e Iberinform, e com a colaboração do IPN – Instituto Pedro Nunes. O projeto AEP Link é cofinanciado pelo Compete 2020, pelo Portugal 2020 e pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER). O encontro prosseguiu até às 15h00 com um almoço de networking.